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"Nosso Grupo de Genealogia da Familia Freire será tão forte quanto seus membros o façam"

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Comentários sobre o falecimento de

Newton Freire Maia 

A Genética Humana do Dr Newton

Erasto Villa-Branco-Jr


Faleceu em Curitiba Newton Freira-Maia, professor do Departamento de Genética da Universidade Federal do Paraná. Seu falecimento deu-se em decorrência de complicações provocadas pelo tratamento de um câncer de pulmão, no dia 10 de maio de 2003.

HISTÓRICO
O professor Newton Freire-Maia teve um significado muito especial para a Ciência do país todo, principalmente no que concerne à Genética, que é uma parte da Biologia que ele e algumas outras poucas pessoas introduziram no país nas décadas de 1940 e 1950. Foi ainda um dos criadores, no Brasil, de uma área específica da Genética que é a Genética Humana.

Trabalhava desde 1946, dando aulas, recebendo aulas e pesquisando, na Universidade de São Paulo - USP - quando foi convidado, em 1951, a mudar-se para a Universidade Federal do Paraná (na época Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras) que tinha carência de professor na área de Genética, que estava então sendo introduzida no Brasil. Na Universidade Federal Do Paraná criou o Laboratório de Genética, que posteriormente originou o Departamento de Genética, no qual ficou trabalhando até aposentar-se e, sem interrupção, por mais 24 anos, até seu falecimento. Foram 52 anos de trabalho na Universidade Federal Do Paraná.

ÁREAS DE TRABALHO
De início o professor Newton Freire-Maia trabalhou com drosófilas, que são pequenas moscas encontradiças próximas às frutas maduras. Estudou as características genéticas das populações destas moscas, que foram fundamentais para a compreensão dos fenômenos genéticos e que foram o principal material de trabalho para fazer da Genética o que ela é hoje.

Tinha obtido conhecimentos nesta área com o grande evolucionista russo Theodosius Dobzhansky, que esteve no Brasil por longas temporadas dando cursos para professores universitários, e que foi o principal responsável pela introdução da Genética no Brasil.

Posteriormente o professor Newton Freire-Maia trabalhou com seres humanos, inicialmente com casamentos consangüíneos, que são casamentos entre pessoas aparentadas entre si, avaliando os efeitos da consangüinidade entre seus descendentes. Seus trabalhos nesta área ajudaram a compreender os efeitos de alelos de genes prejudiciais em diferentes populações, do Brasil e de outros países.

Foi um dos primeiros no país a realizar um serviço de Aconselhamento Genético, que consiste em esclarecer pessoas leigas sobre questões ligadas às características (principalmente doenças) de origem genética.

Com seres humanos trabalhou por muitos anos com um conjunto de doenças denominado Displasias Ectodérmicas, sendo elas originadas por malformações de dentes, unhas, cabelo e glândulas sodoríparas (glândulas que produzem o suor). Foi o idealizador de uma forma de classificação destas displasias que é hoje utilizada em todo o mundo, tendo ele mesmo, juntamente com colaboradores, descrito e classificado dezenas delas, o que equivale a mais de 10% de todas as displasias ectodérmicas descritas pelo mundo todo.

DADOS BIOGRÁFICOS
O professor Newton Freire-Maia nasceu em 29 de junho de 1918, na cidade de Boa Esperança, em Minas Gerais. Teve quatro filhos com sua esposa dona. Flávia Leite Naves Freire-Maia, com a qual viveu por 24 anos, até o falecimento dela. Casou-se então com a professora Eleidi Alice Chautard-Freire-Maia, com a qual viveu por 29 anos, até falecer.

PRODUÇÃO CIENTÍFICA
Ao todo, o professor Newton Freire-Maia produziu 474 obras bibliográficas, distribuídas do seguinte modo:

Artigos publicados em periódicos 345; Completos 201; Resumos 144; Trabalhos publicados em anais de eventos 36; Completos 3; Resumos 33; Livros ou capítulos de livros 53; Livros publicados (em primeira edição) 19; Livros publicados (reedições) 11; Livro não-publicados 1; Capítulos de livros publicados 22; Textos em jornais ou revistas não-científicos 34; Jornais não-científicos 28; Revistas não-científicas 6; Demais tipos de produção bibliográfica 6.

O professor Newton Freire-Maia, ao longo de sua carreira científica orientou direta ou indiretamente, formalmente ou não, dezenas de teses de mestrado e doutorado.

Foi sócio fundador da Sociedade Brasileira de Genética, tendo exercido a presidência, a vice-presidência e outros cargos administrativos nela. Foi também sócio fundador da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, tendo exercido nela também, cargos de presidente, vice-presidente e presidente do Conselho Administrativo.

Foi o representante do Brasil, por um ano, na Organização Mundial da Saúde.

Proferiu inúmeras palestras, participou de inúmeros seminários e mesas redondas, sendo inúmeros também os cursos ministrados em instituições brasileiras e estrangeiras.

Realizou visitas, contatos científicos e trabalhos em diversas regiões do Brasil e em 27 países, sendo mais extensamente em três deles: Estados Unidos, Suíça e Portugal.

TÍTULOS
Recebeu vários prêmios e outras honrarias no Brasil e fora dele, sendo alguns daqueles, da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), do Conselho Nacional do Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), do Governo do Estado do Paraná, da Sociedade Brasileira de Genética (SBG), Academia Brasileira de Ciências (ABC), da Academia Nacional de Medicina, da Universidade Federal do Paraná, do Instituto Ciência e Fé, das Prefeituras Municipais de Curitiba e de Boa Esperança (MG), da Assembléia Legislativa do Estado do Paraná, do Jornal "Indústria e Comércio". Recebeu ainda o Prêmio Heleno Fragoso pelos Direitos Humanos; nos Estados Unidos, recebeu prêmio, pelos seus trabalhos científicos com as displasias ectodérmicas, da National Foundation for Ectodermal Dysplasias e recebeu, do Ministério da Ciência e Tecnologia do Governo Federal, a Comenda da Ordem Nacional do Mérito Científico.

Ciências (ABC), da Academia Nacional de Medicina, da Universidade Federal do Paraná, do Instituto Ciência e Fé, das Prefeituras Municipais de Curitiba e de Boa Esperança (MG), da Assembléia Legislativa do Estado do Paraná, do Jornal "Indústria e Comércio". Recebeu ainda o Prêmio Heleno Fragoso pelos Direitos Humanos; nos Estados Unidos, recebeu prêmio, pelos seus trabalhos científicos com as displasias ectodérmicas, da National Foundation for Ectodermal Dysplasias e recebeu, do Ministério da Ciência e Tecnologia do Governo Federal, a Comenda da Ordem Nacional do Mérito Científico.

CARACTERÍSTICAS PESSOAIS
O professor Newton Freire-Maia despertou sempre admiração das pessoas que o conheciam pessoalmente, por aliar uma grande capacidade para as atividades da Ciência com um caráter fora do comum. Apresentou sempre os mais nobres valores, comportando-se sempre fielmente de acordo com estes princípios morais. Defendeu por toda a vida o direito ao pensamento e à sua livre expressão, e fez que seus alunos e orientados também o fizessem. Mesmo em momentos politicamente difíceis, manteve-se sempre com este direcionamento, às vezes arcando com o preço de sua postura. Incentivou o pensamento crítico em seus alunos, o que considerava um dos alicerces da Ciência. Estimulou sempre o respeito aos outros, mesmo nos casos em que isto era mais difícil de realizar. Teve sempre uma postura de valorização da honestidade e de respeito ao Bem Público, o que passou fortemente aos que com ele conviveram. Estes valores e este comportamento nortearam o de seus alunos e orientados, que por isto sentem-se seus devedores e admiradores.

http://www.cienciaefe.org.br/jornal/0405/Mt06.htm


Newton Freire-Maia
mestre, amigo, sábio, humilde

Aroldo Murá G. Haygert


De todo o grupo fundador do Instituto Ciência e Fé, iniciado em abril de 1995, aquele que com certeza melhor resumiu o espírito da instituição foi o professor Doutor Newton Freire-Maia, cujo primeiro aniversário de falecimento celebramos neste maio de 2004. E por que o geneticista sintetizou tão bem as propostas deste Ciência e Fé? Porque como homem de ciência, incansável no apostolado da pesquisa, no caminhar com a ciência e fazendo ciência, Newton foi igualmente o inquieto espírito em busca de realidades transcendentais.

O itinerário científico de Newton Freire-Maia está nas páginas desta edição especial do Jornal de Ciência e Fé, expresso com precisão por seus colegas, seus alunos e professores que com ele trilharam os caminhos da Genética. Mas a grande aventura espiritual do fundador do Departamento de Genética da Universidade do Paraná, presidente honorário da SBPC, e expoente internacional no estudo da Genética Humana - é um capítulo à parte.

O contínuo questionamento do professor Newton com relação às verdades cristãs que um dia descobriu - já homem maduro - foi até o fim. Ele não foi um manso cordeiro subjugado pelo “maravilhoso cristão” de Chateaubriand. Muitas vezes não escondeu aos mais próximos - como a nós - suas dúvidas, incertezas que procurava responder no plano racional, mas sempre com uma brecha para o Numinoso. E seus dias derradeiros, testemunha a companheira infatigável, sombra amiga e anjo tutelar do sábio mestra - doutora Eleidi - foram de amplo retorno à Casa do Pai.

Newton Freire-Maia deixa, entre seus inumeráveis frutos, as marcas de uma cordialidade e simplicidade que só sábios de seu porte conseguem carregar. Deixa mais, a lição mais generosa de uma vida consumida na pesquisa científica e defesa de causas humanísticas (e de seu socialismo cristão): é preciso indagar, sempre, mesmo correndo o risco de refazer caminhadas tidas como definitivas.

http://www.cienciaefe.org.br/jornal/0405/Mt01.htm


A VANGUARDA
"O que Passou e Permanece"

Jane Marilda de Oliveira
em nome da ADL


A vida comprovou que Newton Freire-Maia nasceu para três missões: ser cientista, ser memorialista e ser amigo.

Sua árvore genealógica explica bem esses dons. Foi o clima intelectual que Newton herdou de seus ancestrais, amantes do estudo, da reflexão e de curiosidades, olhos abertos para a vida, atentos a ela, em plenitude.

Na juventude, na Boa Esperança em que nasceu, testemunhou seu apego à terra, ao publicar o "Esboço Histórico de Boa Esperança", documento único no gênero e referência insubstituível aos pesquisadores do passado do município. A juventude com a família e os amigos, o casamento, constituem a fase em que Newton Freire-Maia, por ainda não ser do mundo, era apenas de Boa Esperança, tão bem lembrada em seu livro de memórias - "O que Passou e Permanece".

A vocação científica o levou. A fidelidade às raízes afetivas o conservaram e foram alimentadas pelo calor da amizade sempre alimentada - característica de seu espírito nobre.

Na fase de plena atividade de pesquisa, o mundo tornou-se sua residência e a a literatura científica é um gigantesco patrimônio que lega à humanidade.

Vasta é a sua biografia, o trabalho de um homem de fé nos benefícios que o avanço da ciência traz à humanidade.

Quando se perde um grande homem, os que o prezam choram lágrimas diferentes: Boa Esperança lamenta a perda de um filho que a honrou e contribuiu com ela para o conhecimento de si mesma; a Ciência lamenta a voz que se cala, o pesquisador que interrompe suas atividades. A família de Boa Esperança - os seus Maia e os Freire, os Leites e os Naves da Flávia, os amigos lamentam e vão mantê-lo vivo nas teias da memória e do amor. Também a família do Paraná constituída após a perda da sua Flávia, pelo também muito feliz casamento com a Dra. Eleidi Alice Chautard-Freire-Maia e os amigos de lá e do mundo, construídos passo a passo, dia a dia, com atenção e zelo, pelo doutor professor em sentimentos nobres - Newton Freire-Maia, o terão vivo e presente, sempre.

Plagiando Fernando Pessoa, o prof. Newton, da cadeira nº 4, da Academia Dourense de Letras - ADL, dobrou a curva da estrada e não é mais visto. Contudo está na mesma estrada, caminhando, como sempre. Entre amigos. Como sempre e para sempre, porque é o HOMEM que passou e permanece.

Jornal A Vanguarda, 25 de maio de 2003, Boa Esperança MG

http://www.cienciaefe.org.br/jornal/0405/Mt02.htm


Inestimável contribuição


Dr. Newton Freire-Maia era escritor com muitas obras científicas e literárias, além de centenas de trabalhos publicados. Era geneticista, tendo proferido palestras em diversos países. Foi condecorado com a Medalha do Mérito Científico, oferecido pelo ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso.

Era ocupante da cadeira de número 4 da Academia Dorense de Letras, cujo patrono era Dominiciano Fulgêncio Maia, seu avô.

A Academia havia preparado uma homenagem ao confrade, programada para 28 de dezembro, quando seria condecorado com medalha de honra ao mérito, mas a solenidade foi adiada porque ele se achava hospitalizado.

Dr Newton Freire-Maia foi o primeiro redator de "A Vanguarda", quando de sua fundação em 1945. Foi autor do primeiro livro histórico da cidade, intitulado "Esboço Histórico de Boa Esperança", editado em 1942.

Com seu falecimento a cidade perde mais um de seus filhos ilustres e o Brasil um de seus lídimos representantes no campo científico da genética humana.

"A Vanguarda", sensibilizada, apresenta à família Freire-Maia as suas mais sentidas condolências.

Da infância à ciência
“O pequeno Newton foi daqueles meninos que dão o maior trabalho para as mães, por sua falta de interesse nos estudos, constantes provocações e a incerteza de um bom futuro... Na infância, foi mau aluno no Grupo Escolar mas gostava de escrever, produzindo romances e poemas. Demorou seis anos para completar as quatro séries do curso primário.

No entanto, seus dias de mau aluno não resistiram à vocação científica. Newton Freire-Maia, mineiro de Boa Esperança, nascido em junho de 1918, em pouco tempo descobriria uma nobre ocupação para a sua mente até os últimos dias.

Aos jovens que pretendem dedicar-se à Ciência, Freire-Maia dá alguns conselhos: “armem-se de boa cultura geral, com ênfase em português, inglês e matemática, façam um curso superior completo, com mestrado e doutorado e, por fim, associem-se, logo no início da carreira, a um cientista em plena atividade de pesquisa, de renome internacional”. São algumas dicas do professor Newton Freire-Maia, que contribuiu mundialmente para o progresso da Genética.

Jornal A Vanguarda, 18 de maio de 2003, Boa Esperança MG

http://www.cienciaefe.org.br/jornal/0405/Mt03.htm


Extraordinária personalidade


Perde a ciência brasileira um de seus mais famosos geneticista, o criador do Departamento de Genética da Universidade do Paraná. Dizer aqui sobre a sua obra é impossível, tal a exigüidade de nossas páginas. Com livros publicados no Brasil e no exterior, Freire-Maia tornou-se mundialmente conhecido como um dos mais notáveis cientistas de nosso tempo.

Por ocasião dos eventos comemorativos dos 45 anos do Departamento de Genética da Universidade Federal do Paraná, destacamos, da conferência pronunciada pelo prof. Oswaldo Frota, o seguinte:

"Newton Freire-Maia adotou, logo de início, como sua primeira natureza, a atitude mental do cientista, mesmo antes de ser um deles. Morou no Rio como boêmio da ciência, estudando por conta própria o que lhe apetecia, assistindo conferências e sessões da Academia de Ciências e procurando os melhores pesquisadores da época para descobrir como eram e como pensavam, sem exclusão de estrangeiros como Julian Huxley, Auguste Lumière e Aléxis Carrel, com quem trocou cartas e artigos."

Já em 1970 Freire Maia era projeção internacional, que o levou a trabalhar em Genebra, como cientista da Unidade de
Genética Humana da Organização Mundial de Saúde. Toda a sua vida, ainda no dizer do prof. Frota, foi invariavelmente dedicada à verdadeira ciência e iluminada, nos últimos anos, por uma intensa fé religiosa. Foi vice-presidente e várias vezes Conselheiro da SBPC e seu Presidente de Honra desde 1989. Consultor da Universidade de Brasília teve a sua biografia publicada em seis obras de referência como "Who is Who in the World" e o "American Mem of Science". Sua inteireza intelectual revelava-se a cada passo e nunca melhor que na responsabilidade que assumia de compatibilizar sua fervorosa fé católica com a sua profissão de fé científica.

Freire-Maia era nosso assinante, tinha especial carinho por este Jornal e por Alfenas. Publicamos inúmeros artigos de sua autoria. Na sua mocidade, quando ainda estudante da EFOA, assinava suas deliciosas crônicas como "Sílvio Ricardo", comentando nossos espetáculos teatrais, era um apaixonado pelas artes cênicas.

O tempo ainda dirá, em pormenores, quem foi esta extraordinária personalidade que perdemos.

Jornal O Alfenense, 27 de julho de 2003, Alfenas MG

http://www.cienciaefe.org.br/jornal/0405/Mt04.htm


SBPC
Sua história, exemplo e amizade permanecerão


Elias Karam Jr


Faleceu em 11/5/03, aos 84 anos, o professor doutor Newton Freire-Maia, fundador da Genética Humana no Brasil. Ele deixa enorme lacuna na comunidade científica. Presidente da honra da SBPC, foi representante do Brasil na Organização Mundial da Saúde, publicou centenas de artigos de pesquisa e diversos livros. Fundou, há 52 anos, o Laboratório de Genética da Universidade Federal do Paraná (UFPR), que veio a dar origem ao atual Departamento de Genética desta Universidade. Formou centenas de geneticistas. Dotado de profunda cultura humanística aliada a sólida formação acadêmica, contribuiu decisivamente para o desenvolvimento da ciência e para o engrandecimento de nosso país. Seus amigos do Departamento de Genética da UFPR fazem este comunicado com profundo pesar. Sua história, exemplo e amizade permanecerão conosco na continuidade da luta por seus ideais.

Transcrito do Jornal de Ciência, edição de 16 de maio de 2003

http://www.cienciaefe.org.br/jornal/0405/Mt07.htm


49º Congresso Nacional da SBG
Homenageia o Dr. Newton


A Sociedade Brasileira de Genética, durante o 49º Congresso Nacional de Genética, em Águas de Lindoia, homenageou o Dr. Newton.

Na ocasião, o Dr. Pedro Manoel Galetti Júnior, presidente da SGB, falou em nome da Sociedade, prestando homenagem ao Newton e entregou à Dra. Eleidi uma placa com os dizeres:

Homenagem da Sociedade Brasileira de Genética
ao
PROFESSOR NEWTON FREIRE-MAIA,

Por ter iluminado os caminhos da
Genética Brasileira

Águas de Lindóia, 18 de setembro de 2003

Ainda como parte das homenagens, discursaram as doutoras Maria Luíza Petzl Erler, Dértia Freire-Maia e Eleidi Freire-Maia.

http://www.cienciaefe.org.br/jornal/0405/Mt09.htm


Ciência e sabedoria


Dra. Maria Luíza Petzl Erler

A ausência do nosso querido Professor Newton muito nos entristece, porém, é com grande alegria que estamos aqui, para contar um pouco sobre a sua história e sobre o seu legado e as profundas impressões que deixou em seus alunos colegas, colaboradores e amigos. Como um dos fundadores da Genética no Brasil, de algum modo, Newton Freire-Maia está presente nas realizações de muitos dos que estão aqui reunidos e de pelo menos outros tantos, ausentes deste Congresso.

O Professor Doutor Newton Freire-Maia faleceu no dia 10 de maio deste ano, em Curitiba, aos 84 anos de idade. Teve quatro filhos, Regina Flávia, Maria de Fátima, Newton Filho (este, já falecido) e Marco Domiciano, e também nove netos. Deixa viúva a Professora Eleidi Alice Chautard Freire-Maia, geneticista. Mineiro de Boa Esperança, nascido em 29 de junho do ano de 1918, Newton Freire-Maia morava no Paraná desde 1951. Formado em Odontologia, já havia decidido dedicar-se à Biologia e à Genética. Por indicação do Professor Padre Jesus Santiago Moure, aceitara o convite do Professor Homero de Mello Braga para ministrar a disciplina de Biologia Geral para os alunos de História Natural da antiga Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras e instalar um Laboratório de Genética, para continuar na Universidade Federal do Paraná as pesquisas que tinha iniciado na Universidade de São Paulo, sobre genética das populações de Drosophila. De 1956 a 1957 esteve durante um ano na Universidade de Michigan, com bolsa da Fundação Rockfeller, quando passou a estudar Genética Humana. Em 1958, o Laboratório de Genética da Universidade Federal do Paraná transformou-se então em Laboratório de Genética Humana e a equipe do Professor Newton, pioneiro na área de Genética Humana e Médica, no Brasil, passou a pesquisar sobre casamentos consangüíneos e malformações dos membros, a princípio. Esse grupo e seus discípulos originaram o atual Departamento de Genética do Setor de Ciências Biológicas da Universidade Federal do Paraná. Newton Freire-Maia foi também pioneiro na implantação de um Serviço de Aconselhamento Genético. Doutorou-se em Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro em 1960, com uma tese sobre Casamentos Consangüíneos no Brasil. Até o início da década de 1970, foi Chefe do Departamento de Genética da Universidade Federal do Paraná. Publicou mais de 200 artigos completos em periódicos científicos especializados e duas dezenas de livros ao longo de sua carreira, além de 22 capítulos de livros e de numerosos artigos de divulgação, em jornais e revistas.

Criou o CEDE - Centro de Estudos de Displasias Ectodérmicas, com a Dra. Marta Pinheiro, o qual logo se tornou referência internacional sobre o assunto. Descreveu 23 entidades nosológicas novas, além de ter criado uma definição e uma classificação clínicas. Publicou três livros sobre as displasias ectodérmicas e vários artigos de revisão. O número total de displasias ectodérmicas conhecidas, que era menor que 10 quando o trabalho foi iniciado, hoje chega a quase 200.

A competência e a capacidade científica do Professor Newton Freire-Maia estão mais do que demonstradas no seu riquíssimo currículo, tão recheado de importantes realizações.

Newton Freire-Maia foi representante do Brasil na Organização Mundial da Saúde, em Genebra na Suíça. Era membro titular da Academia Brasileira de Ciências, presidente de honra da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e da Sociedade Brasileira de Genética, da qual fora sócio fundador e Presidente. Até deixar-nos em maio, foi Professor Emérito da Universidade Federal do Paraná e um dos diretores do Instituto Ciência e Fé, do qual foi Co-Fundador. Ao longo de sua carreira, recebeu numerosos prêmios e homenagens, de instituições de ensino, de pesquisa, governamentais e de outras instituições, brasileiras e estrangeiras. Entre as inúmeras homenagens póstumas que vem recebendo, recentemente, o Parque da Ciência do Estado do Paraná, localizado na região metropolitana de Curitiba, recebeu o nome de Newton Freire-Maia.

Newton Freire-Maia contava que "a ciência e o laboratório entraram muito cedo na vida daquele menino de grupo escolar". O avô paterno, Domiciano, tinha um laboratório, no qual, entre outras coisas, produzia gás hidrogênio, utilizado pelos garotos em seus balões. Foi ali que ele "pôde realizar observações e experiências e encantar-se com elas. Aos 15 anos, ..., decidiu ser cientista". Dizia também que "os caminhos para essa meta não se abriam diante dele com a nitidez e a simplicidade dos rumos que tomaram os seus colegas. Afinal, depois de alguns tropeços e atropelos, já com 24 anos de idade, começou a ser cientista, ... em genética de drosófilas, pelas mãos de Dreyfus e Pavan, no ano de 1946".

Freire-Maia tinha um grande amor pela ciência e uma capacidade ímpar de trabalho. Aposentado havia 22 anos, nunca parou de trabalhar. Diariamente, ia ao Departamento de Genética. Dizia: "a minha residência e esse Departamento são as maiores fontes de felicidade que tenho em Curitiba". Gostava de ensinar e, principalmente, de aprender. Gostava de escrever livros, artigos e resenhas e também cartas, muitas, mantendo intensa correspondência com seu vasto círculo de amigos, que tão bem sabia cultivar.

Suas qualidades humanas e virtudes deixaram marcas profundas em todos que o conheceram. É difícil expressar com palavras a profunda sensação que o Professor Newton deixou em todos os que o conheceram e que tiveram o privilégio de conviverem com ele. Fica o testemunho e a saudade daqueles que tiveram a regalia de conviverem com tão notável pessoa. Tinha uma extraordinária capacidade de comunicação e suas falas costumavam ter grande e interessada audiência, de todas as faixas etárias. Homem discreto, sábio e inquieto, interessava-se por tudo e também questionava tudo, sempre de forma polida. Seus comentários eram certeiros e bem-humorados. Preocupou-se sempre com as questões sociais, em busca de justiça social. Newton Freire-Maia deixou muitas lições e suas atitudes e idéias permitiram que muitas sementes germinassem. A melhor homenagem é seguir o seu exemplo de uma vida rica e criativa, de trabalho proveitoso e prazeroso, de ação e criação embasadas sempre na honestidade, na simplicidade, na humildade e na sabedoria. Para finalizar, uma mensagem do Professor Newton aos jovens. "O jovem que quer ser cientista - e à ciência dedicar todo o seu tempo e amor - tem pelo menos três certezas: a de que morrerá um dia (como todo mundo), a de que não ficará rico (como quase todo mundo) e a de que se divertirá muito (como pouca gente)".

Posteriormente, as palavras da Profa. Dra. Maria Luíza Petzl Erler foram publicadas na Revista da Sociedade Brasileira de Genética (Genetics and Molecular Biology)

http://www.cienciaefe.org.br/jornal/0405/Mt10.htm

Ademar Freire-Maia irmão dele, o pai  farmacêutico Belini Augusto Maia; de sua mãe, D. Castora; tiveram 7 filho, e de seu avô paterno, Domiciano Maia, cientista amador, do qual recebeu influência decisiva para desenvolver seu amor profundo pela ciência.


Um homem excepcional


Dra. Dértia Freire-Maia

Quero agradecer à SBG, também em nome da família, esta homenagem ao nosso quase irmão Newton Freire-Maia e o convite para, juntamente com a Eleidi, representar a família, à qual tenho a honra de pertencer. Muito já foi dito aqui sobre o Newton, mas pessoalmente, eu teria muito mais a dizer sobre ele. Preferi, no entanto, falar a duas vozes, mesclando às minhas, algumas palavras de meu esposo e irmão do Newton, Ademar Freire-Maia, que não pôde comparecer e que também agradece. Newton Freire-Maia, mineiro de origem simples, foi um homem excepcional. Mais do que isso: ele foi excepcional em todas as facetas de sua exuberante personalidade. Ele desenvolveu essa característica sob a influência maravilhosa de seu pai, o farmacêutico Belini Augusto Maia; de sua mãe, D. Castora; e de seu avô paterno, Domiciano Maia, cientista amador, do qual recebeu influência decisiva para desenvolver seu amor profundo pela ciência.

Pela limitação do tempo, vamos citar apenas 3 aspectos da fascinante personalidade do Newton.

Na vida familiar, ele foi um maravilhoso filho, irmão, esposo, pai, tio, cunhado, primo e sogro. Todos nós gostávamos de estar ao seu lado. Sempre muito querido, onde estivesse, seus queridos estavam à sua volta para ouvir as suas histórias, principalmente sobre Boa Esperança, terra natal dos Freire-Maia.

Sua família se orgulha de ter tido o Newton como membro ilustre. O povo de sua terra natal também. Newton dorme e sentimos profundamente sua falta, o membro mais velho dos sete irmãos Freire-Maia principalmente nas nossas reuniões por vários anos, em família, que ele adorava, incentivava e sempre fazia questão de estar presente. Ele foi e é o centro dos Freire-Maia.

Na vida social, Newton foi um excelente amigo e cidadão responsável e consciente. Sempre pronto a ouvir e dar bons conselhos e orientações.

Na vida profissional, foi competente, trabalhador e dedicado, como educador e como cientista.

Toda a vida do Newton foi permeada por uma dose generosa de comportamento ético exemplar e admirável. Todos os que com o Newton se relacionavam sempre aprendiam alguma coisa. Ele foi um exemplo a ser imitado.

Basta mencionar - a título de ilustração -, uma de suas paixões: a ciência. Mas, não vamos dizer o que ele pensava. Vamos deixar que ele próprio diga alguma coisa.

Principalmente para os mais jovens, vou ler alguns de seus pensamentos, nos quais se pode captar, em toda a grandeza, o inesgotável e profundo amor que o Newton tinha pela ciência e pelo trabalho do cientista.

Selecionei algumas frases, colhidas em vários de seus textos de divulgação científica. Ei-las:

- A imaginação do cientista é viva e borbulhante como a de um artista, mas o seu amor aos fatos força-o a esmigalhá-los até seus componentes menores.

- Em informações aparentemente desordenadas e mesmo caóticas, o cientista pode descobrir uma ordem esplendorosa, em que impera a beleza sem par que o Universo mostra, escondendo.

- Compete aos governos colocar o mundo da Ciência ao alcance do povo, não apenas através de escolas gratuitas, mas também de museus, centros científicos e programas de radio e TV. A ciência é uma forma de diversão e todos devem poder se divertir com ela.

- O cientista dedica à ciência toda a sua vida, em todas as suas horas. Tempo integral significa 24 horas por dia e 7 dias por semana. Dedicação exclusiva quer dizer amor.

- Os limites da ciência não são os limites da nossa inquietude, dos nossos ideais, das nossas mais profundas aspirações: essas são ilimitadas. Nossa sede de conhecimentos é uma sede de infinito.

- O verdadeiro cientista tem uma imensa satisfação em realizar o seu trabalho. Ama a ciência e, por isto, gosta de estudar e pesquisar. Aliás, não saberia viver de outra forma: a ciência é sua vida.

http://www.cienciaefe.org.br/jornal/0405/Mt11.htm


UFPR
Freire-Maia deixa legado científico

Cristina Simião


“A genética brasileira perde um dos seus expoentes. A UFPR perde um dos seus mais conceituados e atuantes pesquisadores. A sociedade paranaense, um, intelectual respeitado e engajado na luta pela democracia.
Perdemos todos nós a convivência diária de um pesquisador crítico, humilde, afável, que a todos encantava pela simplicidade e lucidez de suas idéias." Glaci Zancam - presidente da SBPC.

O mineiro de Boa Esperança, que passou mais de meio século dentro dos laboratórios do Departamento de Genética e ajudou a tornar a UFPR conhecida internacionalmente, deixa uma vasta contribuição científica, além do exemplo de carisma e humildade. Esta é a opinião do chefe do Departamento de Genética, Elias Karan Júnior, que seguiu a mesma carreira influenciado pelo que considera um mestre.

Além dos 19 livros, dois dos quais publicados nos Estados Unidos, ficam 437 trabalhos científicos, principalmente sobre as displasias extodérmicas que são distúrbios nos tecidos das células. Freire-Maia classificou 22 displasias, das quase 200 doenças que são conhecidas hoje. O pesquisador, considerado o pai da Genética, chegou à UFPR ajudado pelo amigo Padre Jesus Santiago Moure, do Departamento de Zoologia. Aos 90 anos e ainda cumprindo jornada de 8 horas diárias no Setro de Biologia, Padre Moure diz que o sonho de Freire-Maia, que tinha formação em Odontologia, era atuar na Genética. "Quando surgiu uma vaga o transferimos de São Paulo, onde ministrava aulas na USP." Padre Moure conta que apesar de se julgar ateu, Freire-Maia costumava assistir as missas no Colégio Santa Maria. "Ele gostava da solenidade, mas não entendia o significado", explica. O professor Karam acrescenta: "Freire-Maia dizia que invejava as pessoas que conseguiam ter fé". Mais tarde, por orientação de um padre franciscano, se converteu ao catolicismo a ponto de escrever livros sobre a sensação de ser cristão e a relação entre ciência e religião.

Quando chegou à UFPR, em abril de 1951, Freire-Maia começou a pesquisar moscas domésticas, as drosófilas que coletava nos depósitos de frutas e nas casas. Só anos depois, quando terminou o doutorado no Rio de Janeiro, além de estudos nos Estados Unidos e na Suíça, mudou a linha de trabalho e passou a estudar os efeitos genéticos dos casamentos consangüíneos, como as malformações, retardo mental, entre outros aspectos. "Nas suas aulas, ele conseguia explicar tão bem o aconselhamento genético, que a gente visualizava um casal na frente do professor", lembra Karam, que começou a trabalhar com Freire-Maia ainda menino, há 43 anos. "Eu cuidava das moscas usadas nas pesquisas."

Para a presidente da SBPC - Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, Glaci Zancan, Newton era um asceta da ciência. "Sua vasta cultura, capacidade de diálogo e espírito acolhedor fez com que reunisse ao seu redor a jovem intelectualidade curitibana durante o período militar". Glaci lembra que o pesquisador foi um dos mais atuantes da SBPC, chegando a ocupar a vice-presidência no período de maior dificuldade, quando houve confronto com os militares, de 1975 a 1977. Depois passou a ser considerado presidente de honra da entidade. O reitor Carlos Moreira Júnior, ao lamentar a perda do cientista, lembrou da solenidade dos 90 anos da UFPR, ocorrida em 19 de dezembro do ano passado, quando Freire-Maia recebeu uma medalha por ser um dos professores mais antigos em atividade, tendo se dedicado 52 anos à instituição.

Uma pessoa realizada

Numa das últimas entrevistas que concedeu para a Assessoria de Comunicação da UFPR, publicada no Jornal UF Paraná, em junho de 2001, o cientista dizia que tinha realizado muito mais do que pretendia da vida. "Colhi mais frutos dos que esperava", falou, ao se referir às pesquisas. Explicou também que gostava de ver seu laboratório cheio de jovens interessados pela genética. "Com a idade a gente gosta mais da crianças e dos jovens. Hoje, ao contrário, deixo a porta aberta e quando entra um moço ou uma moça, pra mim é uma alegria. Na mocidade a gente é muito preocupado consigo próprio".


Transcrito de Notícias da UFPR, junho de 2003

http://www.cienciaefe.org.br/jornal/0405/Mt14.htm


GENETICS AND MOLECULAR BIOLOGY
De Boa Esperança para o mundo



Dr. Francisco M. Salzano

Tenho registro de pelo menos três apresentações formais, minhas, do meu querido amigo e quase irmão Newton Freire-Maia, em 1959, 1968 e 1989. Estava longe de imaginar que, um dia, estaria fazendo uma apreciação sobre ele após sua morte. De maneira não muito original vou iniciar esta conversa com as mesmas palavras proferidas há 44 anos atrás: "Era uma vez um rapaz nascido em Boa Esperança, no sul de Minas, que com esforço e tenacidade conseguiu sobrepujar as limitações de seu meio e, apesar de todos os problemas e dificuldades, tornou-se um cientista de renome internacional".

Já tanto se escreveu e falou sobre o Newton que, na verdade, é difícil dizer algo de novo. Felizmente ele foi devidamente apreciado e festejado ao longo dos seus 84 anos de vida. Opto, portanto, para inicialmente mencionar as nossas relações pessoais. Em época tão distante quanto 1951 eu acabara de finalizar meus estudos de graduação e obtivera uma bolsa de aperfeiçoamento da Universidade de São Paulo, para trabalhar em seu Departamento de Biologia, na então Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras. Acontece que a mesa que eu ocupei no famoso casarão da Alameda Glette era justamente a de Freire-Maia, que estava se afastando do Departamento para fundar um Laboratório de Genética na Universidade Federal do Paraná, em Curitiba. Ao fundo da sala havia um armário com uma série de separatas de artigos do Newton que eu, naturalmente, comecei a examinar. Quando de uma passagem rápida pela sala, na minha ausência, ele notou o meu interesse e imediatamente deixou um conjunto delas, com dedicatória, para mim, uma surpresa agradável para um jovem principiante.

Um ano depois eu já havia retornado para Porto Alegre, onde iria se realizar a IV Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, e a incumbência que recebi de um de meus orientadores de São Paulo, Antonio Brito da Cunha, era justamente defender o argumento desenvolvido principalmente por Theodosius Dobzhansky de que as inversões cromossômicas em Drosophila tinham caráter adaptativo, o que era questionado pelo Newton. A discussão decorreu em clima amigável, como ocorreria
com muitas outras, pois em geral nos posicionávamos em campos opostos (como ocorreria, nas décadas de 70 e 80, sobre questões relativas à carga genética e à controvérsia selecionismo versus neutralismo).

Os nossos vínculos de amizade se estreitaram mais quando, juntos, estagiamos em 1956/57, por um ano, no Departamento de Genética Humana da Universidade de Michigan, em Ann Arbor, EUA. Esta minha estréia internacional prolongada foi muito facilitada pelo Newton, que me precedera por três meses lá. Foi ele a primeira pessoa que encontrei, na estação ferroviária de Ann Arbor à minha chegada, e estava à minha disposição imediatamente um apartamento mobiliado (eram três ao todo, um por andar) na casa de madeira em que ele já estava vivendo com sua primeira esposa, Flávia, e duas filhas pequenas. Freqüentemente nossa conversa, no Departamento, se estendia além do horário normal e eram às vezes tão animadas que os americanos vinham verificar se não estávamos brigando!

Após nosso retorno estabeleceu-se um intenso intercâmbio entre os grupos de Curitiba e Porto Alegre, que continua até hoje. As publicações específicas entre o Newton e eu não foram numerosas [duas versões, em português e inglês, de um livro, publicadas respectivamente em 1967 e 1970; um artigo publicado na Suíça sobre a carga genética em índios brasileiros (1962); e a contribuição dele em capítulos de livros que organizei a partir de conferências internacionais
em 1971 e 1975]; mas a interação em termos pessoais e profissionais transcendem de muito estes registros escritos.

Newton Freire-Maia gostava muito de escrever. Seu primeiro livro, denominado "Hereditariedade e vida", foi escrito quando ainda era estudante secundário em Varginha e Belo Horizonte e publicado (através de financiamento paterno) quando ele tinha 19 anos. Eram 500 exemplares que foram amplamente distribuídos entre parentes, amigos, a imprensa e intelectuais de diferentes áreas, inclusive do exterior. Assim, o Newton recebeu cartas neutras ou encorajadoras de pessoas tão importantes quanto Julian Huxley, Aléxis Carrel e Auguste Lumière (o co-inventor, com seu irmão Louis, do cinema). Opinião do Newton sobre esta estréia literária, em sua autobiografia de 1995: "Relendo-o agora fico perplexo. Como é que eu consegui cometer tantos erros crassos em tão poucas páginas? Na realidade, é um livro que tem mais erros do que letras. E, por isto, tornou-me um inimigo violento do autodidatismo. Francamente, ninguém (a não ser um gênio) pode estudar sozinho e produzir algo que preste"!

Após este pecado da juventude, no entanto, o nosso herói produziu uma obra invejável em termos de qualidade e quantidade, de mais de 200 artigos científicos "in extenso", 19 livros (dois deles publicados nos EUA), 22 capítulos de livros e um grande número de artigos para jornais e revistas não-científicas. Fico feliz em lembrar ter eu encaminhado para Ciência Hoje o que deve ter sido um de seus últimos artigos de divulgação ("câncer: causas, prevenção e tratamento", em colaboração com Enilze Ribeiro, publicado no número de dezembro de 2002 daquela revista).

Quais foram os temas que mais o empolgaram durante a sua carreira? Em termos de genética humana desenvolveu várias pesquisas sobre demografia genética e a variabilidade de características normais, mas de especial interesse para esta audiência foram seus estudos sobre: (a) os efeitos genéticos sobre a mortalidade precoce e patologias diversas dos casamentos consangüíneos; (b) os efeitos genéticos das radiações ionizantes; (c) malformações reducionais dos membros; (d) retardamento mental; e (e) displasias ectodérmicas. Com relação a essas últimas condições, quando ele iniciou seus estudos sobre as mesmas, o número de displasias ectodérmicas descritas variava de 1 a 8. Em 1999 ele chegava a quase 160, e cerca de 12% deste total eram síndromes novas, descritas por ele e sua colaboradora, Marta Pinheiro. O trabalho inicial sobre esta série foi publicado em 1971 na revista "Human Heredity", editada na Suíça. Sobre este trabalho ele me escreveu a seguinte nota "Querido Salzaninho (ele sempre me chamava assim!) O Newton da Costa diz que cada cientista publica, em geral, um trabalho importante em toda a sua vida. Mendel publicou um; Einstein chegou a quatro. Este, pelo que me parece, é o trabalho mais importante de todos os meus 50 anos de trabalho. Pequenino (quatro páginas), mas mudou o paradigma da área".

Nenhuma avaliação sobre a vida de Newton Freire-Maia poderia deixar de mencionar sua personalidade encantadora. Eleidi, sua segunda esposa, salientou recentemente que um aspecto marcante desta personalidade era o seu respeito pela liberdade do próximo, fosse ele seu parente, aluno, colega ou desconhecido. Além disso, ele sempre expôs suas idéias em defesa da justiça social, mesmo na época da ditadura. Segundo ela Freire-Maia na intimidade era um esposo, pai (4 filhos, um falecido prematuramente) e avô (nove netos) amoroso e compreensivo, que alegrava as reuniões familiares com sua capacidade de contar casos. "Sua capacidade em fazer amigos e conservar as amizades era notável. Newton foi um ser humano muito bom, verdadeiro e de ótimo gênio" concluiu Eleidi.

Após sua morte Freire-Maia tem recebido muitas homenagens. O reitor da Universidade Federal do Paraná decretou luto oficial de três dias após o seu falecimento. A Assembléia Legislativa do Paraná aprovou voto de pesar na mesma época; e o governador Roberto Requião informou, em 22 de maio, que o Parque da Ciência, naquele estado, será reaberto com o nome de Newton Freire-Maia.

A este reconhecimento oficial somam-se os da enorme legião de seus amigos e admiradores. Newton foi um exemplo marcante de uma vocação irresistível pela ciência (ao contrário do que ele denominava de vocações resistíveis!). Ele permanecerá sempre na memória de seus discípulos e colegas, cientistas ou não-cientistas, mesmo porque, como afirmou Octavio Paz, se a memória se dissolve o homem se dissolve.

Transcrito da Revista da SGBhttp://www.cienciaefe.org.br/jornal/0405/Mt05.htm

 


ADITEPP
Testemunho de vida!

Cristina Simião


Coração aberto, espírito sempre jovem e permanente busca de aperfeiçoamento do saber. Foi assim que Newton Freire-Maia conquistou a todos.

Indivíduo de destaque não só no mundo da ciência, mas também no das relações interpessoais. Envolvia as pessoas pelo encantamento que tinha pelos desafios que as questões mais profundas da vida incitavam em sua pessoa. Mas também pela sua determinação na busca do desvelamento destas questões. Tudo isso o tornou uma pessoa admirável.

Seu jeito sempre afável, carinhoso, tranqüilo e simples fazia com que todos se sentissem amigos e irmãos daquele que foi um dos mais notáveis geneticistas dos nossos tempos.

A ADITEPP se sente honrada em poder ter tido, na pessoa de Newton Freire-Maia, seu conselheiro, seu sócio e, nos anos mais difíceis da
ditadura militar, seu Secretário Geral.

A pessoa de Newton nos deixou em maio, mas seu legado permanece entre nós. Legado de amor à vida, de paixão pela busca e pela procura em dar sentido à vida. Legado pelo testemunho da energia amorosa que emanava de seus gestos e pelo envolvimento com iniciativas de caráter político-social comprometidas com a construção de um mundo mais humano e fraterno.

Cabe a nós incorporar este testemunho por ele vivido, comprometendo-nos mais ainda na luta por uma cidadania onde todos possam viver de forma mais solidária e irmanada.

Transcrito do Informativo da ADITEPP, agosto de 2003

http://www.cienciaefe.org.br/jornal/0405/Mt13.htm


Outras homenagens


Faz um ano que perdemos, lamentavelmente, o Dr. Newton Freire-Maia, diretor e co-fundador do Instituto. Brilhante figura humana mereceu inúmeras homenagens neste período.

Algumas homenagens:

O Jornal Gazeta do Povo publicou "Morre o pai da genética paranaense" de Rogério Waldrigues Galindo, em 12/05/03, artigo disponível no site do instituto Ciência e Fé (www.cienciaefe.org.br/online/0305/newton.htm)

O Jornal Ciência e Fé fez uma Edição especial, em Junho 2003, que está disponível no site do Instituto Ciência e Fé (www.cienciaefe.org.br/jornal/jcf0503.htm).

O Setor de Ciências Biológicas da UFPR instituiu, em 2003, o prêmio Newton Freire Maia para o aluno que concluísse cursos de graduação desse Setor com melhor desempenho. Na mesma época, também foi instituído o prêmio Pe. Jesus S. Moure - que com 91 anos de idade, continua trabalhando.

Em agosto de 2003, a VI Semana de Biologia da Universidade Tuiuti, em Curitiba, foi realizada em homenagem ao Dr. Newton Freire-Maia.

A UFPR decretou luto oficial de 3 dias após o seu falecimento.

A Assembléia Legislativa do Paraná aprovou voto de pesar na mesma época.

O Governador Roberto Requião informou, em 22 de maio, que o Parque da Ciência, em Curitiba PR, será reaberto com o nome de Newton Freire-Maia.